Descrição - Doença infectocontagiosa viral aguda, que se manifesta de várias formas: infecções inaparentes, quadro febril inespecífico, meningite asséptica, formas paralíticas e morte. O quadro clássico é caracterizado por paralisia flácida de início súbito. O déficit motor instala-se subitamente e a evolução dessa manifestação, freqüentemente, não ultrapassa três dias. Acomete, em geral, os membros inferiores, de forma assimétrica, tendo como principal característica a flacidez muscular, com sensibilidade conservada e arreflexia no segmento atingido. Apenas as formas paralíticas possuem características típicas: instalação súbita da deficiência motora, acompanhada de febre; assimetria, acometendo sobretudo a musculatura dos membros, com mais freqüência os inferiores; flacidez muscular, com diminuição ou abolição de reflexos profundos na área paralisada; sensibilidade conservada e persistência
de alguma paralisia residual (seqüela) após 60 dias do início da doença.
A paralisia dos músculos respiratórios e da deglutição implica em risco de vida para o paciente. As formas paralíticas são pouco freqüentes (1% a 1,6% dos casos) se comparadas às formas inaparentes da infecção (90% a 95% dos casos).
Sinonímia - Paralisia infantil.
Agente etiológico - O poliovírus é um vírus RNA, gênero Enterovírus, da família Picornaviridae, com três sorotipos: I, II e III.
Reservatório - O homem.
Modo de transmissão - Principalmente por contato direto pessoa a pessoa, pelas vias fecal-oral (a principal) ou oral-oral. Essa última através de gotículas de muco da orofaringe.
Período de incubação - Geralmente, de 7 a 12 dias, podendo variar de 2 a 30 dias.
Período de transmissibilidade - Não se conhece com exatidão. O vírus é encontrado nas secreções da orofaringe após 36 a 72 horas a partir da infecção, onde se instala e persiste por uma semana. Nas fezes, é encontrado por cerca de 3 a 6 semanas.
Complicações - Seqüelas paralíticas. Parada respiratória devido à paralisia muscular.
Diagnóstico laboratorial
Isolamento do vírus - É feito a partir de amostras de fezes do caso ou de seus contatos (até o décimo quarto dia do início do déficit motor deve ser coletada uma amostra de fezes em torno de 4 a 8 gramas, o correspondente ao tamanho de um dedo polegar de adulto. As amostras deverão ser conservadas em freezer a 200C até o momento do envio ao laboratório de referência. Se não houver freezer, conservar em refrigerador comum de 4 a 80C por no máximo três dias (jamais colocar as amostras no congelador do refrigerador);
Método de PCR (Polymerase Chain Reaction) - Permite a amplificação da seqüência alvo do genoma viral em pelo menos cem mil vezes em poucas horas, aumentando consideravelmente a sensibilidade do diagnóstico viral, permitindo a identificação do tipo e origem do vírus isolado. O sequenciamento dos nucleotídeos identifica a quantidade das mutações e recombinação do vírus derivado vacinal. Para ser considerado derivado vacinal este vírus precisa apresentar mutações de pelo menos 1%, podendo adquirir neurovirulência.
Exames inespecíficos - Líquor, necessário para fazer o diagnóstico diferencial com a síndrome de Guillain-Barré e com as meningites que evoluem com deficiência motora. Na poliomielite, observa-se um discreto aumento do número de células, podendo haver discreto aumento de proteínas.
Na síndrome de Guillain-Barré, observa-se uma dissociação proteinocitológica (aumento acentuado de proteínas) e, nas meningites, aumento do número de células, com alterações bioquímicas. A eletromiografia pode contribuir para descartar a hipótese diagnóstica de poliomielite.
Critérios para a coleta de amostras de contatos
Quando o caso sob investigação apresentar clínica compatível com poliomielite;
Quando houver suspeita de reintrodução ou recirculação do poliovírus selvagem;
Contato de casos em que haja isolamento do vírus vacinal derivado.
Observar que os contatos não são necessariamente intradomiciliares, embora, quando presentes, devam ser priorizados para a coleta de amostras de fezes. Os contatos não devem ter recebido a vacina oral contra pólio (VOP) nos últimos 30 dias.
Toda e qualquer coleta de comunicantes deverá ser discutida previamente com o nível nacional.
Diagnóstico diferencial - Polineurite pós-infecciosa e outras infec ções que causam paralisia: síndrome de Guillain-Barré, mielite transversa, meningite viral, meningoencefalite e infecções por outros enterovírus (Echo, tipo 71, e Coxsackie, especialmente do grupo A, tipo 7).
Tratamento – Procure seu médico ou posto de saúde.
Características epidemiológicas - Esta doença foi de alta incidência no Brasil e em outros países americanos, deixando centenas de indivíduos com seqüelas paralíticas. Em 1989, registrou-se o último caso no país, após um período de realização de grandes campanhas vacinais e intensificação das ações de vigilância epidemiológica. Em 1994, o poliovírus selvagem foi considerado erradicado do Brasil e das Américas.
Atualmente, continua circulando de forma endêmica ou como casos esporádicos e em surtos em 11 países do continente africano, o que impõe a manutenção de uma vigilância ativa para impedir a reintrodução e recirculação do agente nas áreas erradicadas.
VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA
Objetivos - Detectar precocemente a reintrodução do poliovírus selvagem no território brasileiro, pela vigilância ativa das paralisias flácidas agudas em menores de 15 anos.
Notificação - Notificação compulsória e investigação imediata dos casos de paralisias flácidas agudas (PFA) em menores de 15 anos ou de casos suspeitos de poliomielite em pessoas de qualquer idade.
Definição de caso
• Confirmado - Devem ser classificados nessa categoria todos os casos de PFA em que houve isolamento de poliovírus selvagem na(s) amostra(s) de fezes do caso ou de seus comunicantes, independentemente de haver ou não seqüela após 60 dias do início da deficiência motora.
• Poliomielite associada à vacina - Casos de PFA em que há isolamento de vírus vacinal na(s) amostra(s) de fezes e presença de seqüela compatível com poliomielite, 60 dias após o início da deficiência motora. Há dois tipos de poliomielite relacionados com a vacina:
a) Paralisia flácida aguda que se inicia entre 4 e 45 dias após o recebimento da VOP e que apresenta seqüela neurológica compatível com poliomielite 60 dias após o início do déficit motor;
b) PFA que surge após contato com criança que tenha recebido VOP até 40 dias antes. A paralisia surge de 4 a 85 dias após a vacinação e o caso deve apresentar seqüela neurológica compatível com poliomielite 60 dias após o déficit motor.
• Poliovirus vacinal derivado (PVDV) - Caso de PFA com isolamento de poliovirus que apresenta mais de 1% de diferença genética em relação ao virus vacinal correspondente.
• Não-poliomielite (descartado) - Casos de PFA com amostra de fezes adequada (uma amostra coletada até quatorze dias do início do déficit motor), na qual não houve isolamento de poliovírus.
• Poliomielite compatível - Casos de PFA que não tiveram coleta adequada de amostra de fezes e apresentaram seqüela aos 60 dias ou evoluíram para óbito ou têm evolução ignorada.
Medidas para notificação de casos de PFA com suspeita de poliomielite
Em virtude das características de transmissão do poliovírus, silenciosa e rápida, e da ocorrência de grande número de infecções sem manifestações clínicas, a vigilância deve ser intensificada quando da notificação de casos de PFA que tenham suspeita de poliomielite. Essa intensificação implica em abranger, além do local de residência do doente, as localidades visitadas nos 30 dias anteriores ao início da paralisia, em caso de viagem, bem como os locais de residência de possíveis visitas recebidas no mesmo período, onde pode estar a provável fonte de infecção. Além da realização de visita às unidades de saúde, a situação da cobertura vacinal da área deve ser criteriosamente avaliada.
Indicadores de qualidade da vigilância epidemiológica pós-certificação
Informação de notificação negativa semanal de, pelo menos, 80% das unidades de notificação negativa implantadas; taxa de notificação de, pelo menos, um caso de PFA por 100.000 habitantes menores de 15 anos; pelo menos 80% dos casos notificados devem ser investigados dentro das 48 horas posteriores à notificação e pelo menos 80% dos casos de PFA notificados devem ter uma amostra de fezes para cultivo de vírus, coletada no período máximo de duas semanas após o início da deficiência motora.
MEDIDAS DE CONTROLE
Além de uma vigilância ágil e sensível à detecção de casos de poliomielite importados, a vacinação é a medida mais eficaz para manter erradicada a circulação do poliovírus selvagem nas Américas. Portanto, além da vacinação de rotina nos serviços de saúde, visando assegurar o mais precocemente possível a imunização adequada de todas as crianças nascidas, as campanhas anuais de vacinação são importantes para garantir um nível adequado de imunidade de grupo na população, através da disseminação no meio ambiente, em curto intervalo de tempo, do vírus vacinal, que compete com a circulação do vírus selvagem.
O Brasil adota em seu esquema vacinal básico a vacina antipólio oral (VPO - Sabin) no seguinte esquema: 1ª dose aos 2 meses; 2ª dose, aos 4 meses; 3ª dose, aos 6 meses; reforço, aos 15 meses. Entende-se por criança adequadamente vacinada aquela que recebeu três ou mais doses de vacina oral contra a poliomielite, com um intervalo mínimo de 30 dias entre cada dose. Em ambas as atividades (vacinação de rotina e campanhas) devem ser alcançadas coberturas vacinais altas (95%) em todos os municípios.