ABORDAGEM DO PORTADOR DE DST
O atendimento de pacientes com DST tem algumas particularidades. Ele visa interromper a cadeia de transmissão da forma mais efetiva e imediata possível. Visa, ainda, evitar as complicações advindas da(s) DST em questão, e a cessação imediata dos sintomas.
O objetivo desse atendimento é tentar prover, em uma única consulta: diagnóstico, tratamento e aconselhamento adequados. Não há impedimento para que exames laboratoriais sejam colhidos ou oferecidos. A conduta, no entanto, não deverá depender de demorados processos de realização e/ou interpretação dos exames. Não se quer dizer com isto que o laboratório seja dispensável, ao contrário, tem seu papel aumentado principalmente em unidades de saúde de maior complexidade, que servirão como fontes para a definição do perfil epidemiológico das diferentes DST e de sua sensibilidade aos medicamentos preconizados.
Fluxogramas específicos, já desenvolvidos e testados, são instrumentos que auxiliarão o profissional que realiza o atendimento na tomada de decisões. Seguindo os passos dos fluxogramas, o profissional, ainda que não especialista, estará habilitado a: determinar um diagnóstico sindrômico, implementar o tratamento imediato, realizar aconselhamento para estimular a adesão ao tratamento, para a redução de riscos, para a convocação, orientação e tratamento de parceiros, promoção de incentivo ao uso de preservativos, dentre outros aspectos.
Os fluxogramas incluem uma série de polígonos de decisão e ação que contêm as informações básicas necessárias ao manejo dos pacientes.
Para o uso do fluxograma, o profissional identifica o polígono correspondente ao problema clínico que encontra-se no topo do quadro e segue, passo a passo, tomando as decisões necessárias, de acordo com os achados clínicos.
Após o fluxograma de cada síndrome, são apresentadas as notas correspondentes a cada polígono de decisão e ação. Essas notas, ainda que parte essencial do fluxograma, são demasiadamente detalhadas para serem incluídas nos polígonos.
Informações mais específicas sobre as doenças abrangidas por cada síndrome serão oferecidas imediatamente após as notas de esclarecimento de cada fluxograma. As informações sobre as DST que não fizerem parte das síndromes serão apresentadas em capítulos posteriores.
O exame físico e a anamnese do paciente e de seus contatos sexuais devem constituir-se nos principais elementos diagnósticos das DST, tendo em vista a dificuldade de acesso imediato aos exames laboratoriais. O médico, e mesmo os demais profissionais de saúde, deverão conhecer os principais aspectos anatômicos e funcionais, tanto do organismo masculino como do feminino, para poder, junto com os dados da anamnese, fazer um diagnóstico de presunção das principais síndromes (abordagem sindrômica) ou doenças transmitidas pelo sexo, lembrando que, na mulher, diversas DST podem apresentar-se de maneira assintomática durante período variável de tempo.
É importante frisar que obter informações fidedignas para a realização de uma anamnese consistente e precisa implica na construção de uma relação de confiança entre o profissional de saúde e o indivíduo em atendimento. Para tal, o profissional deve ter em mente que no contexto assistencial das DST, questões sobre sexualidade, fidelidade, prazer, desprazer, violência, conceito de risco, de doença, de saúde e outros, são apresentados das mais variadas formas, de acordo com a história de cada um dos interlocutores (paciente e profissional), seu meio socioeconômico e sua personalidade.
Sabemos que as DST implicam em práticas de foro íntimo e são decorrentes do exercício da sexualidade. Sendo assim, os profissionais têm a oportunidade ímpar de conversar sobre aspectos da intimidade da vida da pessoa em atendimento e, portanto, precisam ter clareza a respeito dos valores sexuais do paciente, assim como de seus próprios valores. Dessa forma, atitudes de preconceito, juízos de valor e imposição de condutas poderão ser evitadas e, apesar das eventuais diferenças, o diálogo será garantido.
Caso contrário, conseqüências negativas poderão ocorrer, como por exemplo: omissão de informações necessárias para a realização do diagnóstico ou despreocupação quanto à real gravidade da doença ou, por outro lado, superdimensioná-la, causando, desta forma, angústias desnecessárias ou até mesmo desajustes conjugais.
Nesse sentido entendemos que o paciente deverá ser visto como um todo, constituído por sentimentos, crenças, valores, aspectos estes determinantes das práticas de risco e atitudes diante do tratamento prescrito. Seu comportamento orgânico também não se restringe aos órgãos genitais; lembremos que outras doenças (ex.: diabetes, dermatoses, imunodeficiências, etc.), o estado nutricional e o uso de medicamentos, podem interferir tanto no diagnóstico como no tratamento das DST.
No atendimento motivado por DST, os profissionais de saúde deverão incluir o exame clínico-genital minucioso que contemple a busca de outras DST, educação para redução de riscos, orientação sobre cuidados higiênicos, oferecimento do teste anti-HIV, aconselhamento, estímulo à adesão ao tratamento, promoção do uso de preservativos, convocação dos parceiros sexuais e a notificação do caso; sempre que possível deverá ser feita a pesquisa e a observação de achados que possam
identificar outras doenças, por meio de: inspeção geral, controle de pressão arterial, palpação de mamas, toque retal; a citologia oncótica de colo de útero deverá ser realizada quando houver indicação e por ocasião do retorno da paciente.
EXAME FÍSICO
Observar pele, mucosas e palpar os gânglios de todos os segmentos corporais (cabeça, tronco e membros), particularmente, a palma das mãos, plantas dos pés, mucosa orofaríngea e dos genitais. Quaisquer lesões (ulceradas ou não, em baixo ou alto relevo, hiperêmica, hipercrômica, circular, irregular, circinada, etc.), no abdômen, dorso, couro cabeludo e principalmente na região perineal, deverão ser anotadas e correlacionadas com a história em questão.
Doenças como sífilis podem ter, além da região genital, outros locais de infecção. A gonorréia pode apresentar formas diferentes da enfermidade abrangendo regiões não genitais (ex.: faringite, osteoartrite, conjuntivite, peri-hepatite, etc.). O eritema multiforme e a cefaléia, podem acompanhar o linfogranuloma venéreo.
Assim como estas observações, muitas outras poderiam ser feitas, já que as DST não devem ser procuradas por sinais isolados, mas sim por um conjunto de informações e de dados clínicos que possam sugerir o diagnóstico.
EXAME GENITAL MASCULINO
Para uma melhor inspeção, tanto da região inguinal quanto dos órgãos genitais externos, o paciente deverá estar em pé, com as pernas afastadas, e o clínico sentado. Para a região ano-retal, o paciente deverá curvar-se para a frente, afastando as nádegas com suas próprias mãos ou, melhor ainda, deitado em decúbito lateral com leve ante flexão do tronco e da coxa não encostada na maca.
Observar e palpar cadeias ganglionares e quaisquer outras tumorações, ulcerações, fístulas, fissuras, etc. Notar possíveis desvios do eixo peniano, aberturas anômalas da uretra, assimetria testicular, processo inflamatório da bolsa escrotal. Sempre que possível, efetuar o toque retal à procura de tumorações e saliências, além de alterações da próstata.
EXAME GENITAL FEMININO
Pelas próprias características femininas, o ginecologista, ou clínico, necessitará contar com a total cooperação da paciente. Para tanto, deverá captar sua confiança, descrevendo todos os procedimentos a serem realizados, ressaltando o fato de que todo o material a ser utilizado é esterilizado. O exame deve ser realizado com a paciente em posição ginecológica.
No exame estático deve-se observar a disposição dos pêlos, conformações anatômicas (grandes e pequenos lábios, clitóris, hímen, monte de Vênus, períneo, borda anal), distrofias, discromias, tumorações, ulcerações, etc.
Para o exame dinâmico utilizar luvas de procedimento, descartáveis; deve-se colocar os dedos indicador e médio na região que corresponde às glândulas de Bartholin (aproximadamente às 5 e 7 horas) e tracioná-las para baixo e para fora. Com isso pode-se entreabrir a vulva, que ficará completamente exposta, solicitando-se à paciente para aumentar a pressão intra-abdominal.
O exame especular deverá ser feito, após breve explicação sobre o instrumento à paciente. Ascoletas dos materiais deverão ser feitas antes de qualquer lubrificação ou limpeza, devendo ser evitada, portanto, a colocação de vaselina no espéculo. Coloca-se o espéculo esterilizado sempre com uma inclinação de 75o, pressionando a parede posterior da vagina, usando o dedo indicador e médio para expor o intróito vaginal (evitando o traumatismo de uretra e bexiga); observar coloração e pregueamento vaginal, além do aspecto do colo uterino, principalmente do muco cervical; notar a presença ou não de secreções, tumorações, ulcerações e roturas; efetuar corretamente a coleta de material para análise laboratorial quando em presença de secreção, de lesões vegetantes ou ulceradas. Em seguida, efetuar a limpeza do orifício externo do colo com ácido acético 5% e fazer o teste de Schiller (lugol) para evidenciar lesões do colo e ectopias. Não havendo corrimento vaginal e/ ou cervical, ou após o tratamento das secreções ou lesões, coletar material para colpocitologia oncótica, quando houver indicação.
A retirada do espéculo deverá ser tão cuidadosa quanto a sua colocação, evitando-se prender o colo entre as lâminas do espéculo ou retirando-se o mesmo totalmente aberto, o que causará dor e traumatismo uretral. Durante a retirada, lenta e cuidadosa, observar as paredes vaginais. Quando disponível o aparelho, realizar o exame colposcópico observando toda a genitália, incluindo ectocérvice, vagina, vulva e ânus.
O toque vaginal também deverá ser previamente explicado à paciente e realizado com luva estéril (sem necessidade de ter o padrão cirúrgico). Deve-se usar inicialmente o dedo indicador para deprimir o períneo posterior, o que contribuirá para o relaxamento da musculatura. Introduz-se então os dedos médios e indicador (previamente lubrificados), procurando sentir a elasticidade vaginal, presença de tumorações e/ou abaulamentos, consistência e tamanho do colo e aberturas do canal cervical. Movendo-se o colo para um lado e outro, traciona-se os ligamentos cardinais e largo podendo evidenciar-se processos inflamatórios.
Somente após todas estas manobras é que se deve tocar com a outra mão a parede abdominal da paciente, sempre respeitando os movimentos respiratórios e aproveitando a expiração para a palpação profunda.
A mão vaginal empurra o colo e o útero para cima para que o fundo do mesmo possa ser palpado entre a mão abdominal e a vaginal. Durante a palpação, notar seu tamanho, consistência, mobilidade, a regularidade de sua forma, o ângulo em relação ao colo e à vagina e a possível sensibilidade da paciente.
As regiões anexas são palpadas inserindo os dedos vaginais lateralmente ao colo, até o fundo do fórnix, e tracionando as estruturas na pelve com a mão abdominal. As estruturas anexas (ligamento largo, trompa e ovário) são palpadas entre as duas mãos. Estas estruturas podem não ser palpáveis, principalmente em mulheres após a menopausa ou obesas. Geralmente, as trompas não são palpáveis, a menos que estejam aumentadas. Deve-se procurar por massas e alterações da sensibilidade. O tamanho, a forma, a consistência e a sensibilidade de qualquer massa também devem ser determinados.
O toque retal, quando necessário, deverá ser explicado para a paciente, e realizado com uso de lubrificante. Facilita o exame pedir à paciente para fazer força durante a inserção do dedo examinador. Palpa-se o canal anal à procura de massas. Utilizando a mesma técnica abdominovaginal, as estruturas pélvicas são novamente palpadas. Deve-se prestar atenção especial ao septo retrovaginal, aos ligamentos uterossacrais, ao fundo de saco e ao fundo uterino posterior. É durante este exame que melhor se encontram massas do fundo de saco de Douglas.
PESQUISA DE OUTRAS DST
As associações entre diferentes DST são freqüentes. Destaca-se, atualmente, a relação entre a presença de DST e o aumento do risco de infecção pelo HIV.
O cumprimento de todos os passos da anamnese, do exame físico e a coleta de secreções e material para a realização do diagnóstico etiológico, o oferecimento para realização do diagnóstico sorológico anti-HIV e o aconselhamento devem fazer parte da rotina. No entanto, lembramos que a realização do exame para detecção de anticorpos anti-HIV deve ocorrer se o profissional sentir-se capacitado para realizar o aconselhamento pré e pós-teste.
ACONSELHAMENTO
O aconselhamento é entendido como um "processo de escuta ativa individualizado e centrado no cliente. Pressupõe a capacidade de estabelecer uma relação de confiança entre os interlocutores, visando o resgate dos recursos internos do cliente para que ele mesmo tenha possibilidade de reconhecer-se como sujeito de sua própria saúde e transformação." (CN DST/Aids - MS, 1997)
Tido como um instrumento importante para a quebra na cadeia de transmissão das DST, o aconselhamento auxilia o paciente a:
Esta prática pressupõe o reconhecimento pelo profissional de que o sucesso a ser alcançado depende da ação conjunta de ambos interlocutores (profissional e paciente). Implica, portanto, na participação ativa do paciente no processo terapêutico e na promoção de um diálogo no qual a mensagem é contextualizada às características e vivências do indivíduo em atendimento. A idéia demarcada no processo de aconselhamento é a TROCA:
OBJETIVOS DO ACONSELHAMENTO
Na medida que, no processo de aconselhamento, a "demanda" do paciente, entendida como suas necessidades, dúvidas, preocupações, medos, angústias, etc., relacionadas ao seu problema de saúde, é identificada e acolhida, torna-se possível o desenvolvimento de uma relação de confiança e a promoção de apoio emocional. Dessa forma, o nível de estresse do paciente é reduzido, propiciando as condições para o alcance dos seguintes objetivos:
ACONSELHAMENTO INDIVIDUAL E COLETIVO
O aconselhamento pode ser realizado tanto em grupo como individualmente. Na abordagem coletiva, as questões comuns expressas pelos participantes devem nortear o conteúdo a ser abordado. Nesse sentido, a identificação da demanda do grupo é fundamental.
No grupo, as pessoas têm a oportunidade de redimensionar suas dificuldades ao compartilhar dúvidas, sentimentos, conhecimentos, etc. Em algumas circunstâncias, essa abordagem pode provocar alívio do estresse emocional vivenciado pelos pacientes. A dinâmica grupal também pode favorecer o indivíduo a perceber sua própria demanda, a reconhecer o que sabe e sente, estimulando sua participação nos atendimentos individuais subsequentes. Os grupos realizados em sala de espera podem ser um exemplo dessa abordagem, além de otimizarem o tempo que o usuário passa no serviço de saúde.
É importante, entretanto, que o profissional esteja atento para perceber os limites que separam as questões que devem ser abordadas no espaço grupal daquelas pertinentes ao atendimento individual.
QUEM FAZ O ACONSELHAMENTO?
Todos os profissionais da equipe de saúde deveriam estar aptos a desenvolver o aconselhamento. É fundamental que a pessoa que realiza esta atividade tenha informações atualizadas e tecnicamente corretas sobre DST/Aids. Outro aspecto importante para que o aconselhamento se desenvolva adequadamente é adotar uma postura de acolhimento valorizando o que o paciente sabe, pensa e sente a respeito do seu problema de saúde, facilitando desta forma a formação do vínculo de confiança essencial em todo o processo.
Cabe à equipe do serviço de saúde funcionar de maneira harmônica e integrada e organizar-se da forma mais conveniente para que o aconselhamento seja desenvolvido durante o processo de atendimento dos usuários.
Enfim, para que o Aconselhamento seja viável, os profissionais devem reconhecer os próprios limites, saber que não podem responder a tudo, possibilitando assim um "encontro entre profissionais humanos e pacientes humanos".
PROCEDIMENTOS BÁSICOS DO ACONSELHAMENTO
ACONSELHAMENTO PRÉ-TESTE ANTI-HIV
ACONSELHAMENTO PÓS-TESTE DIANTE DE RESULTADO NEGATIVO:
ACONSELHAMENTO PÓS-TESTE DIANTE DE RESULTADO POSITIVO:
ACONSELHAMENTO PÓS-TESTE DIANTE DE RESULTADO INDETERMINADO:
PRESERVATIVOS
Embora tenha dupla função (anticonceptiva e profilática), o preservativo sempre esteve mais diretamente ligado à prevenção das doenças sexualmente transmissíveis (DST). Antes de surgirem métodos anticoncepcionais como a "pílula", o DIU, o diafragma e a esterilização cirúrgica, por exemplo, o preservativo (juntamente com a prática do coito interrompido) parece ter desempenhado papel relevante na regulação da fecundidade, em vista das reduzidas alternativas anticonceptivas então disponíveis. Contudo, a principal finalidade de seu uso era a prevenção de DST. Isto é válido tanto para os jovens e adolescentes que iniciavam a vida sexual (geralmente, com trabalhadoras sexuais) quanto para homens adultos e casados, em relações extraconjugais.
A partir da década de 50, com o desenvolvimento da penicilina e de outros antibióticos eficazes, as práticas e comportamentos preventivos quanto às DST foram se tornando, cada vez, menos adotados. Para isto, também contribuiu a rápida evolução dos costumes (que instaurou, na grande maioria das sociedades, uma maior liberalidade sexual), desestimulando o recurso aos serviços das trabalhadoras sexuais. Além disso, o aparecimento da pílula anticoncepcional permitiu à mulher ter domínio sobre sua função reprodutiva, pela primeira vez, na história. Sem dúvida, estes foram fatores determinantes para que o uso do preservativo se tornasse, gradualmente, inexpressivo sobretudo nos países em desenvolvimento.
No Brasil, o preservativo é muito pouco usado, seja como método anticonceptivo ou como método profilático das DST/aids. Em pesquisas nacionais realizadas junto a mulheres em idade fértil (MIF), isto é, na faixa etária de 15 a 44 anos, casadas ou em união, o uso do preservativo foi reportado por apenas 1,7% ou 1,8% de todas as usuárias de métodos anticoncepcionais. Entretanto, estes resultados parecem estar subestimados. Com efeito, levantamentos locais junto a homens sexualmente ativos, na faixa etária dos 15 aos 24 anos, detectaram índices de uso do preservativo que variaram de 12,5% a 32,4% (no Rio de Janeiro, respectivamente, para os jovens unidos e não unidos); de 14,7% a 34,1% (em Curitiba); e de cerca de 18% a 40,4% (em Recife). Na cidade de Campinas (São Paulo), pesquisa realizada junto a 305 homens de 18 a 30 anos (solteiros, em sua grande maioria), chegou a resultados similares: 75% dos entrevistados reportaram relações sexuais que ocorreram nos 30 dias anteriores à pesquisa, mas apenas 29,8% destes relataram o uso constante do preservativo.
De qualquer modo, estes níveis de uso do preservativo, sobretudo em tempos de aids, ainda são muito baixos. De certa forma, isso poderia ser justificado por fatores como: "ter um relacionamento estável", "não manter relações casuais ou promíscuas", "ter um bom conhecimento sobre a parceira atual" e "a parceira está usando outro método anticoncepcional", conforme foi detectado em diversas pesquisas qualitativas. Contudo, o surgimento da aids, doença de alta letalidade, para a qual ainda não há medicamentos preventivos, impõe mudanças nos comportamentos, atitudes e práticas sexuais, tanto por parte dos indivíduos quanto da sociedade como um todo.
Sem dúvida, com a crescente possibilidade de exposição ao HIV, o exercício da sexualidade voltou a exigir cuidados com a transmissão de doenças e, neste caso, as medidas preventivas devem ser tomadas por todos os indivíduos, independentemente dos fatores idade ou sexo. Mesmo as pessoas que, por desejarem ter filhos, por serem estéreis ou terem se submetido à esterilização cirúrgica voluntária ou, ainda, por já se encontrarem fora do período reprodutivo não necessitavam recorrer ao uso de métodos anticoncepcionais, também se vêem, hoje, obrigadas a utilizar em sua prática sexual um método de barreira, destinado a minimizar os riscos de exposição ao HIV.
Com isto, a aids veio revalorizar um método antigo, cujos níveis de utilização, em todo o mundo, vinham em constante declínio desde meados da década de 50. Essa rápida mudança, entretanto, também exige mudanças de atitude por parte dos indivíduos, particularmente aquelas que se referem à aceitabilidade e ao uso efetivo de um método (anticoncepcional e profilático) ainda considerado como antiquado, além de ser estigmatizado, pois muito freqüentemente ele é associado a relacionamentos sexuais ilícitos e/ou promíscuos, bem como a práticas sexuais também consideradas como de alto risco.
O uso de preservativos, tanto masculinos quanto femininos, por pessoas sexualmente ativas, é o método mais eficaz para a redução do risco de transmissão do HIV e de outros agentes sexualmente transmissíveis. Sua segurança, no entanto, depende da técnica de uso e de seu uso sistemático em todas as relações sexuais.
PRESERVATIVO MASCULINO
Usuários constantes dos preservativos masculinos apontam como fatores de risco para ruptura ou escape:
PRESERVATIVO FEMININO
O uso regular de preservativos pode levar ao aperfeiçoamento na técnica de utilização, reduzindo a freqüência de ruptura e escape e, conseqüentemente, aumentando sua eficácia.
Os preservativos devem ser promovidos e oferecidos aos pacientes, como parte da rotina de atendimento.
CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
O controle das DST não se obtém apenas com o tratamento de pessoas que se apresentam aos serviços de saúde com sinais e sintomas de DST.
Para que se rompa a cadeia de transmissão das DST, é fundamental que os contatos sexuais do indivíduo infectado sejam localizados e tratados.
A convocação de parceiros também permite que se faça a educação sobre os riscos da infecção pelo HIV para um grupo que está sob maior risco.
A convocação de parceiros deve ser considerada sempre que uma DST é diagnosticada, independentemente do local onde os cuidados de saúde são oferecidos. O parceiro deve receber informações sobre:
PRINCÍPIOS DO SISTEMA DE CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
Qualquer que seja o método usado para convocação dos parceiros, este deve ser baseado nos seguintes princípios: confidencialidade, ausência de coerção, proteção contra discriminação, disponibilidade de serviços para os parceiros, e legalidade da ação.
CONFIDENCIALIDADE
A convocação de parceiros deve ser realizada de modo que toda a informação permaneça confidencial. Assim, qualquer informação sobre o paciente-índice, incluindo identidade, não deve ser revelada ao(s) parceiro(s) e vice-versa. O profissional de saúde simplesmente explicará que a informação sobre um paciente não pode ser dada a outro.
Toda informação escrita deve permanecer confidencial. Onde isto não possa ser garantido, as fichas relacionadas ao paciente-índice que ofereçam informações para localização dos parceiros, devem ser destruídas assim que o parceiro tenha sido localizado, ou fique claro que a localização não será possível.
Se os pacientes e a comunidade perceberem que o serviço de saúde e o sistema de convocação de parceiros mantêm e garantem a confidencialidade, certamente não relutarão em usar estes serviços.
AUSÊNCIA DE COERÇÃO
A convocação de parceiros deve ser voluntária. Os pacientes-índice devem ter acesso aos serviços, tendo ou não cooperado nas atividades de convocação. Podem ocorrer, entretanto, situações nas quais um paciente-índice se recuse a convocar ou a permitir a convocação de um parceiro conhecido pelo profissional de saúde, que pode então sentir que o risco à saúde do parceiro e/ou outros (como um feto) é tão elevado que seria antiético deixar de informá-lo. A decisão sobre a convocação do parceiro seria então tomada após intenso aconselhamento do paciente, que deveria ser informado da intenção do profissional de saúde em agir de acordo com regras baseadas em princípios éticos respaldados pelo Conselho Federal de Medicina (ver adiante o item Legalidade da Ação).
PROTEÇÃO CONTRA DISCRIMINAÇÃO
A convocação de parceiros deverá ser realizada respeitando-se os direitos humanos e a dignidade dos envolvidos, principalmente naquele lugares onde a estigmatização e a discriminação possam se seguir ao diagnóstico, tratamento ou notificação.
DISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS PARA OS PARCEIROS
A convocação de parceiros deve ser realizada apenas onde e quando houver serviços de suporte disponíveis para oferecer uma resposta apropriada.
LEGALIDADE DA AÇÃO
Instrumentos legais que permitam a simples convocação de parceiros pelo paciente-índice não são necessários, mas podem vir a ser para a convocação pelo profissional d saúde.
Durante a execução das atividades de busca ativa, o sigilo sobre a identidade do paciente-índice deverá sempre ser mantido. Entretanto, de acordo com o artigo segundo da resolução número 1359/92 do Conselho Federal de Medicina, será permitida a quebra de sigilo por justa causa (proteção à vida de terceiros, incluindo-se os comunicantes sexuais) quando o próprio paciente recusar-se a fornecer-lhes a informação quanto à sua condição de infectado.
MÉTODOS PARA CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
Independentemente do método de convocação a ser empregado, o profissional que estiver atendendo o paciente-índice deve sempre levantar a questão da convocação de parceiros, e aconselhá-lo sobre:
CONVOCAÇÃO PELO PACIENTE
É o método segundo o qual um paciente-índice é encorajado a convocar o(s) parceiro(s) sem o envolvimento direto dos profissionais de saúde. Neste método, o paciente índice pode:
O profissional de saúde que estiver atendendo o paciente-índice aconselhará sobre o método a ser empregado.
A convocação por intermédio do paciente pode ser usada em qualquer situação e deve fazer parte da rotina de profissionais que atendam pacientes com DST.
CONVOCAÇÃO PELO DE PROFISSIONAL DE SAÚDE
É o método segundo o qual os profissionais de saúde convocam os parceiros do paciente-índice.
A convocação por profissional de saúde é geralmente reservada para os parceiros que provavelmente não serão convocados pelo paciente-índice.
Devido à limitação de recursos disponíveis para convocação, é considerado prioritário convocar as parceiras grávidas de homens portadores de qualquer DST.
MANEJO CLÍNICO DE PARCEIROS
Na chegada ao serviço de saúde, o parceiro deve ser considerado um paciente portador da mesma síndrome ou doença que acometeu o paciente-índice, mesmo que não apresente nenhum sintoma ou sinal. Para tanto deverá receber o mesmo tratamento recomendado o paciente-índice
TREINAMENTO PARA A CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
Qualquer profissional de saúde que esteja oferecendo serviços para DST deve se conscientizar da necessidade da convocação de parceiros e portanto deve estar preparado para fazê-lo.
O treinamento deve cobrir aspectos apropriados a cada situação e tipo de profissional. Por exemplo, profissionais que venham a desempenhar atividades externas requererão treinamento especial.
Os tópicos a serem abordados no treinamento da convocação de parceiros são:
AVALIAÇÃO DO SISTEMA DE CONVOCAÇÃO
Mesmo com pouca evidência documentada de eficiência, o bom senso sugere que a convocação de parceiros contribuirá no controle das DST e infecção pelo HIV. É importante, entretanto, tentar avaliar programas de notificação de parceiros de modo que eles possam ser modificados e melhorados. Os seguintes indicadores poderão ser utilizados:
PROCEDIMENTOS PARA CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
A convocação dos parceiros deverá ser realizada por meio do uso progressivo dos seguintes métodos: convocação pelo paciente índice, convocação por correspondência (aerograma) e busca ativa por profissional de saúde.
CONVOCAÇÃO POR CARTÃO
O profissional de saúde que estiver atendendo o paciente-índice, deve obter o nome, endereço e outras informações de identificação do parceiro, para o preenchimento do cartão de convocação
(ANEXO 1).
O cartão consiste de 2 partes: a parte A é retida pela unidade que preencheu, e a parte B entregue ao paciente-índice que, por sua vez, a entregará ao parceiro. Deve ser preenchido um novo cartão paracada parceiro.
A parte A deve conter: código alfanumérico (que identificará a doença ou síndrome do caso índice, de acordo com o CID), um número de ordem dos cartões emitidos naquele centro; nome do paciente índice; dados do parceiro (nome, endereço); data do preenchimento e assinatura do profissional de saúde que preencheu o cartão.
A parte B deve conter o mesmo código alfanumérico já mencionado; o nome do parceiro; mensagem solicitando seu comparecimento a serviço de saúde; nome do centro de saúde no qual poderá ser atendido; data do preenchimento e assinatura do profissional de saúde que preencheu o cartão.
Quando o parceiro vai ao centro designado e apresenta a parte B, o profissional de saúde identificará, por meio do código alfanumérico, o tipo de DST que ocasionou a convocação e o centro que emitiu o cartão. Procederá então ao tratamento do parceiro de acordo com as orientações deste Manual.
O atendimento a portadores de cartões emitidos por outros centros, deve ser informado ao centro de origem que, deste modo, poderá controlar a necessidade de ações adicionais (ex.: envio de aerogramas).
Todos os cartões devem ser mantidos confidenciais e guardados em locais de acesso controlado pelo profissional responsável pelo sistema de convocação.
CONVOCAÇÃO POR AEROGRAMA
Caso os parceiros não atendam à convocação por cartão (em sete dias úteis), ou o paciente-índice não queira entregar os cartões (mas forneça dados de identificação dos parceiros), deve-se realizar a convocação por meio do uso de aerogramas.
Os aerogramas devem conter: código alfanumérico (que identificará a doença ou síndrome do caso índice, o centro que emitiu o cartão e um número de ordem dos cartões emitidos naquele centro); breve texto solicitando comparecimento a um serviço de saúde por motivo de interesse pessoal; recomendações para evitar disseminação da DST; lista dos centros disponíveis para atendimento no município; data do preenchimento e assinatura do profissional de saúde responsável pela convocação.
CONVOCAÇÃO POR BUSCA ATIVA
Na eventualidade do não comparecimento de parceiros convocados por aerograma em sete dias úteis, deve-se proceder à busca ativa realizada por profissionais treinados especialmente para esse fim. Esta modalidade só poderá ser executada quando forem esgotados todos os recursos disponíveis.
É importante que se estabeleça comunicação entre os centros de atendimento a pacientes com DST a cada semana, a fim de se detectar os casos que necessitam do envio do aerograma ou da busca ativa. A existência de um profissional responsável pelo sistema de convocação de parceiros em cada centro, tornará esta atividade possível.
A informatização do sistema de convocação, com integração entre os centros de uma área geográfica, permitirá rápida troca de informações e o controle das atividades prioritárias. Tal sistema deverá ter senha para acesso de conhecimento apenas do operador e seu chefe imediato, os quais assinarão termo de responsabilidade em relação ao não vazamento de informações.
É importante, mais uma vez, enfatizar que, em qualquer situação, pode-se utilizar a convocação por meio do paciente índice e que cada unidade poderá implementar as atividades do sistema progressivamente, de acordo com a disponibilidade de recursos humanos e materiais.
O atendimento de pacientes com DST tem algumas particularidades. Ele visa interromper a cadeia de transmissão da forma mais efetiva e imediata possível. Visa, ainda, evitar as complicações advindas da(s) DST em questão, e a cessação imediata dos sintomas.
O objetivo desse atendimento é tentar prover, em uma única consulta: diagnóstico, tratamento e aconselhamento adequados. Não há impedimento para que exames laboratoriais sejam colhidos ou oferecidos. A conduta, no entanto, não deverá depender de demorados processos de realização e/ou interpretação dos exames. Não se quer dizer com isto que o laboratório seja dispensável, ao contrário, tem seu papel aumentado principalmente em unidades de saúde de maior complexidade, que servirão como fontes para a definição do perfil epidemiológico das diferentes DST e de sua sensibilidade aos medicamentos preconizados.
Fluxogramas específicos, já desenvolvidos e testados, são instrumentos que auxiliarão o profissional que realiza o atendimento na tomada de decisões. Seguindo os passos dos fluxogramas, o profissional, ainda que não especialista, estará habilitado a: determinar um diagnóstico sindrômico, implementar o tratamento imediato, realizar aconselhamento para estimular a adesão ao tratamento, para a redução de riscos, para a convocação, orientação e tratamento de parceiros, promoção de incentivo ao uso de preservativos, dentre outros aspectos.
Os fluxogramas incluem uma série de polígonos de decisão e ação que contêm as informações básicas necessárias ao manejo dos pacientes.
Para o uso do fluxograma, o profissional identifica o polígono correspondente ao problema clínico que encontra-se no topo do quadro e segue, passo a passo, tomando as decisões necessárias, de acordo com os achados clínicos.
Após o fluxograma de cada síndrome, são apresentadas as notas correspondentes a cada polígono de decisão e ação. Essas notas, ainda que parte essencial do fluxograma, são demasiadamente detalhadas para serem incluídas nos polígonos.
Informações mais específicas sobre as doenças abrangidas por cada síndrome serão oferecidas imediatamente após as notas de esclarecimento de cada fluxograma. As informações sobre as DST que não fizerem parte das síndromes serão apresentadas em capítulos posteriores.
O exame físico e a anamnese do paciente e de seus contatos sexuais devem constituir-se nos principais elementos diagnósticos das DST, tendo em vista a dificuldade de acesso imediato aos exames laboratoriais. O médico, e mesmo os demais profissionais de saúde, deverão conhecer os principais aspectos anatômicos e funcionais, tanto do organismo masculino como do feminino, para poder, junto com os dados da anamnese, fazer um diagnóstico de presunção das principais síndromes (abordagem sindrômica) ou doenças transmitidas pelo sexo, lembrando que, na mulher, diversas DST podem apresentar-se de maneira assintomática durante período variável de tempo.
É importante frisar que obter informações fidedignas para a realização de uma anamnese consistente e precisa implica na construção de uma relação de confiança entre o profissional de saúde e o indivíduo em atendimento. Para tal, o profissional deve ter em mente que no contexto assistencial das DST, questões sobre sexualidade, fidelidade, prazer, desprazer, violência, conceito de risco, de doença, de saúde e outros, são apresentados das mais variadas formas, de acordo com a história de cada um dos interlocutores (paciente e profissional), seu meio socioeconômico e sua personalidade.
Sabemos que as DST implicam em práticas de foro íntimo e são decorrentes do exercício da sexualidade. Sendo assim, os profissionais têm a oportunidade ímpar de conversar sobre aspectos da intimidade da vida da pessoa em atendimento e, portanto, precisam ter clareza a respeito dos valores sexuais do paciente, assim como de seus próprios valores. Dessa forma, atitudes de preconceito, juízos de valor e imposição de condutas poderão ser evitadas e, apesar das eventuais diferenças, o diálogo será garantido.
Caso contrário, conseqüências negativas poderão ocorrer, como por exemplo: omissão de informações necessárias para a realização do diagnóstico ou despreocupação quanto à real gravidade da doença ou, por outro lado, superdimensioná-la, causando, desta forma, angústias desnecessárias ou até mesmo desajustes conjugais.
Nesse sentido entendemos que o paciente deverá ser visto como um todo, constituído por sentimentos, crenças, valores, aspectos estes determinantes das práticas de risco e atitudes diante do tratamento prescrito. Seu comportamento orgânico também não se restringe aos órgãos genitais; lembremos que outras doenças (ex.: diabetes, dermatoses, imunodeficiências, etc.), o estado nutricional e o uso de medicamentos, podem interferir tanto no diagnóstico como no tratamento das DST.
No atendimento motivado por DST, os profissionais de saúde deverão incluir o exame clínico-genital minucioso que contemple a busca de outras DST, educação para redução de riscos, orientação sobre cuidados higiênicos, oferecimento do teste anti-HIV, aconselhamento, estímulo à adesão ao tratamento, promoção do uso de preservativos, convocação dos parceiros sexuais e a notificação do caso; sempre que possível deverá ser feita a pesquisa e a observação de achados que possam
identificar outras doenças, por meio de: inspeção geral, controle de pressão arterial, palpação de mamas, toque retal; a citologia oncótica de colo de útero deverá ser realizada quando houver indicação e por ocasião do retorno da paciente.
EXAME FÍSICO
Observar pele, mucosas e palpar os gânglios de todos os segmentos corporais (cabeça, tronco e membros), particularmente, a palma das mãos, plantas dos pés, mucosa orofaríngea e dos genitais. Quaisquer lesões (ulceradas ou não, em baixo ou alto relevo, hiperêmica, hipercrômica, circular, irregular, circinada, etc.), no abdômen, dorso, couro cabeludo e principalmente na região perineal, deverão ser anotadas e correlacionadas com a história em questão.
Doenças como sífilis podem ter, além da região genital, outros locais de infecção. A gonorréia pode apresentar formas diferentes da enfermidade abrangendo regiões não genitais (ex.: faringite, osteoartrite, conjuntivite, peri-hepatite, etc.). O eritema multiforme e a cefaléia, podem acompanhar o linfogranuloma venéreo.
Assim como estas observações, muitas outras poderiam ser feitas, já que as DST não devem ser procuradas por sinais isolados, mas sim por um conjunto de informações e de dados clínicos que possam sugerir o diagnóstico.
EXAME GENITAL MASCULINO
Para uma melhor inspeção, tanto da região inguinal quanto dos órgãos genitais externos, o paciente deverá estar em pé, com as pernas afastadas, e o clínico sentado. Para a região ano-retal, o paciente deverá curvar-se para a frente, afastando as nádegas com suas próprias mãos ou, melhor ainda, deitado em decúbito lateral com leve ante flexão do tronco e da coxa não encostada na maca.
Observar e palpar cadeias ganglionares e quaisquer outras tumorações, ulcerações, fístulas, fissuras, etc. Notar possíveis desvios do eixo peniano, aberturas anômalas da uretra, assimetria testicular, processo inflamatório da bolsa escrotal. Sempre que possível, efetuar o toque retal à procura de tumorações e saliências, além de alterações da próstata.
EXAME GENITAL FEMININO
Pelas próprias características femininas, o ginecologista, ou clínico, necessitará contar com a total cooperação da paciente. Para tanto, deverá captar sua confiança, descrevendo todos os procedimentos a serem realizados, ressaltando o fato de que todo o material a ser utilizado é esterilizado. O exame deve ser realizado com a paciente em posição ginecológica.
No exame estático deve-se observar a disposição dos pêlos, conformações anatômicas (grandes e pequenos lábios, clitóris, hímen, monte de Vênus, períneo, borda anal), distrofias, discromias, tumorações, ulcerações, etc.
Para o exame dinâmico utilizar luvas de procedimento, descartáveis; deve-se colocar os dedos indicador e médio na região que corresponde às glândulas de Bartholin (aproximadamente às 5 e 7 horas) e tracioná-las para baixo e para fora. Com isso pode-se entreabrir a vulva, que ficará completamente exposta, solicitando-se à paciente para aumentar a pressão intra-abdominal.
O exame especular deverá ser feito, após breve explicação sobre o instrumento à paciente. Ascoletas dos materiais deverão ser feitas antes de qualquer lubrificação ou limpeza, devendo ser evitada, portanto, a colocação de vaselina no espéculo. Coloca-se o espéculo esterilizado sempre com uma inclinação de 75o, pressionando a parede posterior da vagina, usando o dedo indicador e médio para expor o intróito vaginal (evitando o traumatismo de uretra e bexiga); observar coloração e pregueamento vaginal, além do aspecto do colo uterino, principalmente do muco cervical; notar a presença ou não de secreções, tumorações, ulcerações e roturas; efetuar corretamente a coleta de material para análise laboratorial quando em presença de secreção, de lesões vegetantes ou ulceradas. Em seguida, efetuar a limpeza do orifício externo do colo com ácido acético 5% e fazer o teste de Schiller (lugol) para evidenciar lesões do colo e ectopias. Não havendo corrimento vaginal e/ ou cervical, ou após o tratamento das secreções ou lesões, coletar material para colpocitologia oncótica, quando houver indicação.
A retirada do espéculo deverá ser tão cuidadosa quanto a sua colocação, evitando-se prender o colo entre as lâminas do espéculo ou retirando-se o mesmo totalmente aberto, o que causará dor e traumatismo uretral. Durante a retirada, lenta e cuidadosa, observar as paredes vaginais. Quando disponível o aparelho, realizar o exame colposcópico observando toda a genitália, incluindo ectocérvice, vagina, vulva e ânus.
O toque vaginal também deverá ser previamente explicado à paciente e realizado com luva estéril (sem necessidade de ter o padrão cirúrgico). Deve-se usar inicialmente o dedo indicador para deprimir o períneo posterior, o que contribuirá para o relaxamento da musculatura. Introduz-se então os dedos médios e indicador (previamente lubrificados), procurando sentir a elasticidade vaginal, presença de tumorações e/ou abaulamentos, consistência e tamanho do colo e aberturas do canal cervical. Movendo-se o colo para um lado e outro, traciona-se os ligamentos cardinais e largo podendo evidenciar-se processos inflamatórios.
Somente após todas estas manobras é que se deve tocar com a outra mão a parede abdominal da paciente, sempre respeitando os movimentos respiratórios e aproveitando a expiração para a palpação profunda.
A mão vaginal empurra o colo e o útero para cima para que o fundo do mesmo possa ser palpado entre a mão abdominal e a vaginal. Durante a palpação, notar seu tamanho, consistência, mobilidade, a regularidade de sua forma, o ângulo em relação ao colo e à vagina e a possível sensibilidade da paciente.
As regiões anexas são palpadas inserindo os dedos vaginais lateralmente ao colo, até o fundo do fórnix, e tracionando as estruturas na pelve com a mão abdominal. As estruturas anexas (ligamento largo, trompa e ovário) são palpadas entre as duas mãos. Estas estruturas podem não ser palpáveis, principalmente em mulheres após a menopausa ou obesas. Geralmente, as trompas não são palpáveis, a menos que estejam aumentadas. Deve-se procurar por massas e alterações da sensibilidade. O tamanho, a forma, a consistência e a sensibilidade de qualquer massa também devem ser determinados.
O toque retal, quando necessário, deverá ser explicado para a paciente, e realizado com uso de lubrificante. Facilita o exame pedir à paciente para fazer força durante a inserção do dedo examinador. Palpa-se o canal anal à procura de massas. Utilizando a mesma técnica abdominovaginal, as estruturas pélvicas são novamente palpadas. Deve-se prestar atenção especial ao septo retrovaginal, aos ligamentos uterossacrais, ao fundo de saco e ao fundo uterino posterior. É durante este exame que melhor se encontram massas do fundo de saco de Douglas.
PESQUISA DE OUTRAS DST
As associações entre diferentes DST são freqüentes. Destaca-se, atualmente, a relação entre a presença de DST e o aumento do risco de infecção pelo HIV.
O cumprimento de todos os passos da anamnese, do exame físico e a coleta de secreções e material para a realização do diagnóstico etiológico, o oferecimento para realização do diagnóstico sorológico anti-HIV e o aconselhamento devem fazer parte da rotina. No entanto, lembramos que a realização do exame para detecção de anticorpos anti-HIV deve ocorrer se o profissional sentir-se capacitado para realizar o aconselhamento pré e pós-teste.
ACONSELHAMENTO
O aconselhamento é entendido como um "processo de escuta ativa individualizado e centrado no cliente. Pressupõe a capacidade de estabelecer uma relação de confiança entre os interlocutores, visando o resgate dos recursos internos do cliente para que ele mesmo tenha possibilidade de reconhecer-se como sujeito de sua própria saúde e transformação." (CN DST/Aids - MS, 1997)
Tido como um instrumento importante para a quebra na cadeia de transmissão das DST, o aconselhamento auxilia o paciente a:
- compreender a relação existente entre o seu comportamento e o problema de saúde que está apresentando,
- a reconhecer os recursos que tem para cuidar da sua saúde e evitar novas infecções.
Esta prática pressupõe o reconhecimento pelo profissional de que o sucesso a ser alcançado depende da ação conjunta de ambos interlocutores (profissional e paciente). Implica, portanto, na participação ativa do paciente no processo terapêutico e na promoção de um diálogo no qual a mensagem é contextualizada às características e vivências do indivíduo em atendimento. A idéia demarcada no processo de aconselhamento é a TROCA:
- por um lado há o profissional com seu saber técnico científico, suas crenças, valores e suas possibilidades e limites em manejar/conduzir cada caso, e
- por outro lado há o paciente com seu saber, crenças, valores e suas possibilidades e limites em adotar medidas preventivas e seguir as prescrições médicas.
OBJETIVOS DO ACONSELHAMENTO
Na medida que, no processo de aconselhamento, a "demanda" do paciente, entendida como suas necessidades, dúvidas, preocupações, medos, angústias, etc., relacionadas ao seu problema de saúde, é identificada e acolhida, torna-se possível o desenvolvimento de uma relação de confiança e a promoção de apoio emocional. Dessa forma, o nível de estresse do paciente é reduzido, propiciando as condições para o alcance dos seguintes objetivos:
- trocar informações sobre DST, HIV e aids, suas formas de transmissão, prevenção e tratamento;
- realizar avaliação de riscos, permitindo a compreensão/consciência a respeito dos riscos pessoais de infecção para a DST atual e para o HIV;
- identificar os limites e as possibilidades existentes para a adoção de medidas preventivas, estimulando o cuidado de si e dos parceiros;
- promover a adesão ao tratamento; e
- promover a comunicação e tratamento do(s) parceiro(s) sexual (is).
ACONSELHAMENTO INDIVIDUAL E COLETIVO
O aconselhamento pode ser realizado tanto em grupo como individualmente. Na abordagem coletiva, as questões comuns expressas pelos participantes devem nortear o conteúdo a ser abordado. Nesse sentido, a identificação da demanda do grupo é fundamental.
No grupo, as pessoas têm a oportunidade de redimensionar suas dificuldades ao compartilhar dúvidas, sentimentos, conhecimentos, etc. Em algumas circunstâncias, essa abordagem pode provocar alívio do estresse emocional vivenciado pelos pacientes. A dinâmica grupal também pode favorecer o indivíduo a perceber sua própria demanda, a reconhecer o que sabe e sente, estimulando sua participação nos atendimentos individuais subsequentes. Os grupos realizados em sala de espera podem ser um exemplo dessa abordagem, além de otimizarem o tempo que o usuário passa no serviço de saúde.
É importante, entretanto, que o profissional esteja atento para perceber os limites que separam as questões que devem ser abordadas no espaço grupal daquelas pertinentes ao atendimento individual.
QUEM FAZ O ACONSELHAMENTO?
Todos os profissionais da equipe de saúde deveriam estar aptos a desenvolver o aconselhamento. É fundamental que a pessoa que realiza esta atividade tenha informações atualizadas e tecnicamente corretas sobre DST/Aids. Outro aspecto importante para que o aconselhamento se desenvolva adequadamente é adotar uma postura de acolhimento valorizando o que o paciente sabe, pensa e sente a respeito do seu problema de saúde, facilitando desta forma a formação do vínculo de confiança essencial em todo o processo.
Cabe à equipe do serviço de saúde funcionar de maneira harmônica e integrada e organizar-se da forma mais conveniente para que o aconselhamento seja desenvolvido durante o processo de atendimento dos usuários.
Enfim, para que o Aconselhamento seja viável, os profissionais devem reconhecer os próprios limites, saber que não podem responder a tudo, possibilitando assim um "encontro entre profissionais humanos e pacientes humanos".
PROCEDIMENTOS BÁSICOS DO ACONSELHAMENTO
- reafirmar a confidencialidade e o sigilo das informações prestadas;
- identificar com clareza a demanda do cliente;
- prestar apoio emocional ao cliente;
- facilitar ao cliente a expressão de sentimentos;
- identificar as crenças e os valores do cliente acerca das DST, HIV e aids;
- utilizar linguagem compatível com a cultura do cliente;
- trocar informações específicas sobre a(s) DST apresentada(s);
- avaliar com o cliente seu histórico de outras DST e as situações de risco que culminaram nesta DST;
- reforçar a necessidade da adoção de práticas mais seguras para a redução de riscos;
- explicar as complicações decorrentes de não ser feito o tratamento, ou do tratamento ser incompleto ou da auto-medicação;
- reforçar a necessidade de retorno ao serviço se não houver melhora ou sempre que apresentar algum sintoma;
- reforçar a necessidade do tratamento dos parceiros sexuais;
- trocar informações sobre DST e HIV e aids, suas formas de transmissão, prevenção e tratamento, com ênfase nas situações de risco do cliente;
- ajudar o cliente a avaliar e perceber seus riscos de infecção pelo HIV e outras DST;
- identificar barreiras para a mudança das situações de risco;
- contribuir para a elaboração de um plano viável de redução de riscos;
- explicar o benefício e demonstrar o uso correto do preservativo;
- avaliar possíveis dificuldades quanto ao uso do preservativo e sua superação;
- avaliar e recomendar a possibilidade de outras práticas sexuais seguras;
- ajudar o cliente a reconhecer suas responsabilidades e possibilidades em lidar com seu problema;
- lembrar que o consumo de álcool e outras drogas, lícitas ou ilícitas pode alterar a percepção de risco;
- estimular a auto-estima e autoconfiança do cliente;
- favorecer a desconstrução de estigmas, mitos e preconceitos relacionados às DST e HIV e aids;
- estimular a disseminação das orientações recebidas;
- encaminhar o cliente para outros serviços de assistência, incluindo grupos comunitários de apoio, quando necessário;
- enfatizar a relação entre DST e HIV e aids, principalmente o fato de uma DST facilitar a transmissão do HIV, qualquer que seja ela;
- oferecer testagem anti-HIV e aconselhamento pré e pós-teste.
ACONSELHAMENTO PRÉ-TESTE ANTI-HIV
- reafirmar o caráter voluntário e confidencial da testagem;
- avaliar com o cliente a realização ou não do teste;
- verificar história anterior de testagem e riscos;
- trocar informações sobre o sistema de teste e o conceito de "janela imunológica";
- trocar com o cliente informações sobre o significado dos possíveis resultados do teste;
- reforçar para o cliente a diferença entre HIV e aids;
- considerar com o cliente o impacto em sua vida dos possíveis resultados do teste;
- sondar qual o apoio emocional e social disponível ao cliente (família, parceiros, amigos, trabalho e outros);
- considerar com o cliente possíveis reações emocionais no período de espera do resultado do teste;
- reforçar a necessidade da adoção de práticas seguras frente ao HIV, também neste período.
ACONSELHAMENTO PÓS-TESTE DIANTE DE RESULTADO NEGATIVO:
- informar que um resultado negativo significa que a pessoa não está infectada ou foi infectada tão recentemente que não produziu anticorpos necessários para detecção pelo teste utilizado;
- avaliar a possibilidade do cliente estar em "janela imunológica" e necessitar de um novo teste;
- lembrar que um resultado negativo não significa imunidade;
- reforçar as práticas seguras já adotadas ou a serem adotadas pelo cliente frente ao HIV;
- reforçar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para o consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correto de limpeza e desinfecção de seringas e agulhas, caso seja necessário.
ACONSELHAMENTO PÓS-TESTE DIANTE DE RESULTADO POSITIVO:
- permitir o tempo necessário para que o cliente assimile o impacto do diagnóstico e expresse seus sentimentos;
- conversar sobre sentimentos e dúvidas, prestando o apoio emocional necessário;
- estar atento para o manejo adequado de sentimentos comuns, tais como raiva, ansiedade, depressão, medo, negação e outros;
- desmistificar sentimentos que associam HIV/AIDS a culpa, punição, rejeição, degenerescência, morte, e outros;
- retomar que um resultado positivo significa que a pessoa é portadora do vírus, podendo ou não estar com a doença desenvolvida;
- enfatizar que mesmo sendo um portador assintomático pode transmitir o vírus para outros;
- reforçar a importância de acompanhamento médico, ressaltando que a infecção é controlável;
- reforçar a necessidade da adoção de práticas seguras para a redução de riscos de re-infecção pelo HIV e outras DST;
- reforçar o benefício e demonstrar o uso correto do preservativo, caso ainda haja dúvidas;
- reforçar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para o consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correto de limpeza e desinfecção de seringas e agulhas, caso seja necessário.
- enfatizar a necessidade do resultado ser comunicado aos parceiros sexuais oferecendo ajuda, caso seja solicitada;
- orientar quanto a necessidade dos parceiros realizarem o teste anti-HIV;
- definir com o cliente os serviços de assistência necessários, incluindo grupos comunitários de apoio;
- em caso de gestante explicar:
- as formas de transmissão vertical do HIV (da gestante para o feto), que podem ocorrer durante a gestação, parto ou aleitamento;
- como pode minimizar as chances da transmissão vertical;
- a transmissão dos anticorpos maternos e o processo de soroconversão no recém-nascido;
- os riscos da amamentação; e
- a necessidade de realizar o teste de todos os filhos nascidos após a infecção.
ACONSELHAMENTO PÓS-TESTE DIANTE DE RESULTADO INDETERMINADO:
- explicar que um resultado indeterminado pode significar: um falso positivo devido a razões biológicas ou um verdadeiro positivo de uma infecção recente cujos anticorpos não estão plenamente desenvolvidos;
- reforçar a adoção de práticas seguras para a redução de riscos de infecção pelo HIV e outras DST;
- reforçar o benefício e demonstrar o uso correto do preservativo;
- reforçar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para o consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correto de limpeza e desinfecção de seringas e agulhas, caso seja necessário;
- orientar a realização de nova coleta para refazer o teste no período definido pelo laboratório; e
- considerar com o cliente possíveis reações emocionais no período de espera do resultado do teste e referenciar para apoio psicológico, se necessário.
PRESERVATIVOS
Embora tenha dupla função (anticonceptiva e profilática), o preservativo sempre esteve mais diretamente ligado à prevenção das doenças sexualmente transmissíveis (DST). Antes de surgirem métodos anticoncepcionais como a "pílula", o DIU, o diafragma e a esterilização cirúrgica, por exemplo, o preservativo (juntamente com a prática do coito interrompido) parece ter desempenhado papel relevante na regulação da fecundidade, em vista das reduzidas alternativas anticonceptivas então disponíveis. Contudo, a principal finalidade de seu uso era a prevenção de DST. Isto é válido tanto para os jovens e adolescentes que iniciavam a vida sexual (geralmente, com trabalhadoras sexuais) quanto para homens adultos e casados, em relações extraconjugais.
A partir da década de 50, com o desenvolvimento da penicilina e de outros antibióticos eficazes, as práticas e comportamentos preventivos quanto às DST foram se tornando, cada vez, menos adotados. Para isto, também contribuiu a rápida evolução dos costumes (que instaurou, na grande maioria das sociedades, uma maior liberalidade sexual), desestimulando o recurso aos serviços das trabalhadoras sexuais. Além disso, o aparecimento da pílula anticoncepcional permitiu à mulher ter domínio sobre sua função reprodutiva, pela primeira vez, na história. Sem dúvida, estes foram fatores determinantes para que o uso do preservativo se tornasse, gradualmente, inexpressivo sobretudo nos países em desenvolvimento.
No Brasil, o preservativo é muito pouco usado, seja como método anticonceptivo ou como método profilático das DST/aids. Em pesquisas nacionais realizadas junto a mulheres em idade fértil (MIF), isto é, na faixa etária de 15 a 44 anos, casadas ou em união, o uso do preservativo foi reportado por apenas 1,7% ou 1,8% de todas as usuárias de métodos anticoncepcionais. Entretanto, estes resultados parecem estar subestimados. Com efeito, levantamentos locais junto a homens sexualmente ativos, na faixa etária dos 15 aos 24 anos, detectaram índices de uso do preservativo que variaram de 12,5% a 32,4% (no Rio de Janeiro, respectivamente, para os jovens unidos e não unidos); de 14,7% a 34,1% (em Curitiba); e de cerca de 18% a 40,4% (em Recife). Na cidade de Campinas (São Paulo), pesquisa realizada junto a 305 homens de 18 a 30 anos (solteiros, em sua grande maioria), chegou a resultados similares: 75% dos entrevistados reportaram relações sexuais que ocorreram nos 30 dias anteriores à pesquisa, mas apenas 29,8% destes relataram o uso constante do preservativo.
De qualquer modo, estes níveis de uso do preservativo, sobretudo em tempos de aids, ainda são muito baixos. De certa forma, isso poderia ser justificado por fatores como: "ter um relacionamento estável", "não manter relações casuais ou promíscuas", "ter um bom conhecimento sobre a parceira atual" e "a parceira está usando outro método anticoncepcional", conforme foi detectado em diversas pesquisas qualitativas. Contudo, o surgimento da aids, doença de alta letalidade, para a qual ainda não há medicamentos preventivos, impõe mudanças nos comportamentos, atitudes e práticas sexuais, tanto por parte dos indivíduos quanto da sociedade como um todo.
Sem dúvida, com a crescente possibilidade de exposição ao HIV, o exercício da sexualidade voltou a exigir cuidados com a transmissão de doenças e, neste caso, as medidas preventivas devem ser tomadas por todos os indivíduos, independentemente dos fatores idade ou sexo. Mesmo as pessoas que, por desejarem ter filhos, por serem estéreis ou terem se submetido à esterilização cirúrgica voluntária ou, ainda, por já se encontrarem fora do período reprodutivo não necessitavam recorrer ao uso de métodos anticoncepcionais, também se vêem, hoje, obrigadas a utilizar em sua prática sexual um método de barreira, destinado a minimizar os riscos de exposição ao HIV.
Com isto, a aids veio revalorizar um método antigo, cujos níveis de utilização, em todo o mundo, vinham em constante declínio desde meados da década de 50. Essa rápida mudança, entretanto, também exige mudanças de atitude por parte dos indivíduos, particularmente aquelas que se referem à aceitabilidade e ao uso efetivo de um método (anticoncepcional e profilático) ainda considerado como antiquado, além de ser estigmatizado, pois muito freqüentemente ele é associado a relacionamentos sexuais ilícitos e/ou promíscuos, bem como a práticas sexuais também consideradas como de alto risco.
O uso de preservativos, tanto masculinos quanto femininos, por pessoas sexualmente ativas, é o método mais eficaz para a redução do risco de transmissão do HIV e de outros agentes sexualmente transmissíveis. Sua segurança, no entanto, depende da técnica de uso e de seu uso sistemático em todas as relações sexuais.
PRESERVATIVO MASCULINO
- deve ser armazenado afastado do calor, observando-se a integridade da embalagem, bem como o prazo de validade;
- deve ser colocado antes da penetração, após obtida ereção peniana;
- o receptáculo existente na extremidade do preservativo deve ser apertado durante a colocação, retirando todo o ar do seu interior;
- ainda segurando a ponta do preservativo, desenrolá-lo até a base do pênis;
- devem ser usados apenas lubrificantes de base aquosa pois o uso de lubrificantes oleosos (como vaselina ou óleos alimentares) danifica o látex, ocasionando sua ruptura;
- no caso de ruptura, o preservativo deve ser substituído imediatamente;
- após a ejaculação, retirar o pênis ainda ereto, segurando o preservativo pela base para que não haja vazamento de esperma; e
- o preservativo não pode ser reutilizado, e deve ser descartado no lixo (não no vaso sanitário) após o uso.
Usuários constantes dos preservativos masculinos apontam como fatores de risco para ruptura ou escape:
- más condições de armazenamento;
- não observação do prazo de validade;
- lubrificação vaginal insuficiente;
- sexo anal sem lubrificação adequada;
- uso de lubrificantes oleosos;
- presença de ar e/ou ausência de espaço para recolher o esperma na extremidade do preservativo;
- tamanho inadequado em relação ao pênis;
- perda de ereção durante o ato sexual;
- contração da musculatura vaginal durante a retirada do pênis;
- retirada do pênis sem que se segure firmemente a base do preservativo;
- uso de dois preservativos (devido à fricção que ocorre entre eles); e
- uso de um mesmo preservativo durante coito prolongado.
PRESERVATIVO FEMININO
- leve ser armazenado afastado do calor, observando-se a integridade da embalagem, bem como o prazo de validade;
- não deve ser usado junto com o preservativo masculino;
- ao contrário do preservativo masculino, o feminino pode ser colocado até oito horas antes da relação, e retirado com tranqüilidade após a relação, de preferência antes da mulher levantar-se, para evitar que o esperma escorra do interior do preservativo;
- o preservativo feminino já vem lubrificado, no entanto, se for preciso, devem ser usados, na parte interna, lubrificantes de base aquosa;
- para colocá-lo corretamente, a mulher deve encontrar uma posição confortável (em pé com um dos pés em cima de uma cadeira, sentada com os joelhos afastados, agachada ou deitada); o anel móvel deve ser apertado e introduzido na vagina; com o dedo indicador ele deve ser empurrado o mais profundamente possível para alcançar o colo do útero; a argola fixa (externa) deve ficar aproximadamente 3 cm para fora da vagina; durante a penetração o pênis deve ser guiado para o centro do anel externo;
- deve ser utilizado um novo preservativo a cada nova relação.
O uso regular de preservativos pode levar ao aperfeiçoamento na técnica de utilização, reduzindo a freqüência de ruptura e escape e, conseqüentemente, aumentando sua eficácia.
Os preservativos devem ser promovidos e oferecidos aos pacientes, como parte da rotina de atendimento.
CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
O controle das DST não se obtém apenas com o tratamento de pessoas que se apresentam aos serviços de saúde com sinais e sintomas de DST.
Para que se rompa a cadeia de transmissão das DST, é fundamental que os contatos sexuais do indivíduo infectado sejam localizados e tratados.
A convocação de parceiros também permite que se faça a educação sobre os riscos da infecção pelo HIV para um grupo que está sob maior risco.
A convocação de parceiros deve ser considerada sempre que uma DST é diagnosticada, independentemente do local onde os cuidados de saúde são oferecidos. O parceiro deve receber informações sobre:
- a natureza da exposição e risco da infecção;
- a necessidade de pronto atendimento médico, bem como os locais onde consegui-lo;
- a necessidade de evitar contato sexual até que seja tratado e/ou aconselhado.
PRINCÍPIOS DO SISTEMA DE CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
Qualquer que seja o método usado para convocação dos parceiros, este deve ser baseado nos seguintes princípios: confidencialidade, ausência de coerção, proteção contra discriminação, disponibilidade de serviços para os parceiros, e legalidade da ação.
CONFIDENCIALIDADE
A convocação de parceiros deve ser realizada de modo que toda a informação permaneça confidencial. Assim, qualquer informação sobre o paciente-índice, incluindo identidade, não deve ser revelada ao(s) parceiro(s) e vice-versa. O profissional de saúde simplesmente explicará que a informação sobre um paciente não pode ser dada a outro.
Toda informação escrita deve permanecer confidencial. Onde isto não possa ser garantido, as fichas relacionadas ao paciente-índice que ofereçam informações para localização dos parceiros, devem ser destruídas assim que o parceiro tenha sido localizado, ou fique claro que a localização não será possível.
Se os pacientes e a comunidade perceberem que o serviço de saúde e o sistema de convocação de parceiros mantêm e garantem a confidencialidade, certamente não relutarão em usar estes serviços.
AUSÊNCIA DE COERÇÃO
A convocação de parceiros deve ser voluntária. Os pacientes-índice devem ter acesso aos serviços, tendo ou não cooperado nas atividades de convocação. Podem ocorrer, entretanto, situações nas quais um paciente-índice se recuse a convocar ou a permitir a convocação de um parceiro conhecido pelo profissional de saúde, que pode então sentir que o risco à saúde do parceiro e/ou outros (como um feto) é tão elevado que seria antiético deixar de informá-lo. A decisão sobre a convocação do parceiro seria então tomada após intenso aconselhamento do paciente, que deveria ser informado da intenção do profissional de saúde em agir de acordo com regras baseadas em princípios éticos respaldados pelo Conselho Federal de Medicina (ver adiante o item Legalidade da Ação).
PROTEÇÃO CONTRA DISCRIMINAÇÃO
A convocação de parceiros deverá ser realizada respeitando-se os direitos humanos e a dignidade dos envolvidos, principalmente naquele lugares onde a estigmatização e a discriminação possam se seguir ao diagnóstico, tratamento ou notificação.
DISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS PARA OS PARCEIROS
A convocação de parceiros deve ser realizada apenas onde e quando houver serviços de suporte disponíveis para oferecer uma resposta apropriada.
LEGALIDADE DA AÇÃO
Instrumentos legais que permitam a simples convocação de parceiros pelo paciente-índice não são necessários, mas podem vir a ser para a convocação pelo profissional d saúde.
Durante a execução das atividades de busca ativa, o sigilo sobre a identidade do paciente-índice deverá sempre ser mantido. Entretanto, de acordo com o artigo segundo da resolução número 1359/92 do Conselho Federal de Medicina, será permitida a quebra de sigilo por justa causa (proteção à vida de terceiros, incluindo-se os comunicantes sexuais) quando o próprio paciente recusar-se a fornecer-lhes a informação quanto à sua condição de infectado.
MÉTODOS PARA CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
Independentemente do método de convocação a ser empregado, o profissional que estiver atendendo o paciente-índice deve sempre levantar a questão da convocação de parceiros, e aconselhá-lo sobre:
- a natureza confidencial de suas informações,
- a possibilidade de estarem infectados parceiros sem sintomas,
- a possibilidade de reinfecção se um parceiro permanece infectado,
- as conseqüências para o parceiro, se não tratado,
- as conseqüências para outros contatos do parceiro, se este não for tratado.
CONVOCAÇÃO PELO PACIENTE
É o método segundo o qual um paciente-índice é encorajado a convocar o(s) parceiro(s) sem o envolvimento direto dos profissionais de saúde. Neste método, o paciente índice pode:
- oferecer informação ao parceiro;
- acompanhar o parceiro à clínica;
- simplesmente entregar um cartão de convocação.
O profissional de saúde que estiver atendendo o paciente-índice aconselhará sobre o método a ser empregado.
A convocação por intermédio do paciente pode ser usada em qualquer situação e deve fazer parte da rotina de profissionais que atendam pacientes com DST.
CONVOCAÇÃO PELO DE PROFISSIONAL DE SAÚDE
É o método segundo o qual os profissionais de saúde convocam os parceiros do paciente-índice.
A convocação por profissional de saúde é geralmente reservada para os parceiros que provavelmente não serão convocados pelo paciente-índice.
Devido à limitação de recursos disponíveis para convocação, é considerado prioritário convocar as parceiras grávidas de homens portadores de qualquer DST.
MANEJO CLÍNICO DE PARCEIROS
Na chegada ao serviço de saúde, o parceiro deve ser considerado um paciente portador da mesma síndrome ou doença que acometeu o paciente-índice, mesmo que não apresente nenhum sintoma ou sinal. Para tanto deverá receber o mesmo tratamento recomendado o paciente-índice
TREINAMENTO PARA A CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
Qualquer profissional de saúde que esteja oferecendo serviços para DST deve se conscientizar da necessidade da convocação de parceiros e portanto deve estar preparado para fazê-lo.
O treinamento deve cobrir aspectos apropriados a cada situação e tipo de profissional. Por exemplo, profissionais que venham a desempenhar atividades externas requererão treinamento especial.
Os tópicos a serem abordados no treinamento da convocação de parceiros são:
- aconselhamento e habilidades educacionais: intervenção em crises de relacionamento, condução de discussões em sexualidade e comportamento sexual;
- história natural e epidemiologia das DST, incluindo a infecção pelo HIV (transmissão sexual, infecção assintomática, conseqüências da falta de adesão ao tratamento);
- implicações psicossociais das DST e infecção pelo HIV;
- habilidades e técnicas de entrevistas;
- técnicas na localização e convocação de parceiros;
- mensagens de redução de risco;
- locais de atendimento;
- manutenção de registros;
- avaliação.
AVALIAÇÃO DO SISTEMA DE CONVOCAÇÃO
Mesmo com pouca evidência documentada de eficiência, o bom senso sugere que a convocação de parceiros contribuirá no controle das DST e infecção pelo HIV. É importante, entretanto, tentar avaliar programas de notificação de parceiros de modo que eles possam ser modificados e melhorados. Os seguintes indicadores poderão ser utilizados:
- (Nº pacientes com parceiros convocados / Nº pacientes atendidos)
- (Nº cartões de convocação preenchidos / Nº pacientes atendidos)
- (Nº parceiros convocados por cartão atendidos / Nº pacientes atendidos)
- (Nº parceiros convocados por cartão atendidos / Nº cartões de convocação preenchidos)
- (Nº aerogramas enviados / Nº pacientes atendidos)
- (Nº parceiros convocados por aerograma atendidos / Nº aerogramas enviados)
- (Nº visitas realizadas / Nº pacientes atendidos)
- (Nº parceiros convocados por visita atendidos / Nº visitas realizadas)
PROCEDIMENTOS PARA CONVOCAÇÃO DE PARCEIROS
A convocação dos parceiros deverá ser realizada por meio do uso progressivo dos seguintes métodos: convocação pelo paciente índice, convocação por correspondência (aerograma) e busca ativa por profissional de saúde.
CONVOCAÇÃO POR CARTÃO
O profissional de saúde que estiver atendendo o paciente-índice, deve obter o nome, endereço e outras informações de identificação do parceiro, para o preenchimento do cartão de convocação
(ANEXO 1).
O cartão consiste de 2 partes: a parte A é retida pela unidade que preencheu, e a parte B entregue ao paciente-índice que, por sua vez, a entregará ao parceiro. Deve ser preenchido um novo cartão paracada parceiro.
A parte A deve conter: código alfanumérico (que identificará a doença ou síndrome do caso índice, de acordo com o CID), um número de ordem dos cartões emitidos naquele centro; nome do paciente índice; dados do parceiro (nome, endereço); data do preenchimento e assinatura do profissional de saúde que preencheu o cartão.
A parte B deve conter o mesmo código alfanumérico já mencionado; o nome do parceiro; mensagem solicitando seu comparecimento a serviço de saúde; nome do centro de saúde no qual poderá ser atendido; data do preenchimento e assinatura do profissional de saúde que preencheu o cartão.
Quando o parceiro vai ao centro designado e apresenta a parte B, o profissional de saúde identificará, por meio do código alfanumérico, o tipo de DST que ocasionou a convocação e o centro que emitiu o cartão. Procederá então ao tratamento do parceiro de acordo com as orientações deste Manual.
O atendimento a portadores de cartões emitidos por outros centros, deve ser informado ao centro de origem que, deste modo, poderá controlar a necessidade de ações adicionais (ex.: envio de aerogramas).
Todos os cartões devem ser mantidos confidenciais e guardados em locais de acesso controlado pelo profissional responsável pelo sistema de convocação.
CONVOCAÇÃO POR AEROGRAMA
Caso os parceiros não atendam à convocação por cartão (em sete dias úteis), ou o paciente-índice não queira entregar os cartões (mas forneça dados de identificação dos parceiros), deve-se realizar a convocação por meio do uso de aerogramas.
Os aerogramas devem conter: código alfanumérico (que identificará a doença ou síndrome do caso índice, o centro que emitiu o cartão e um número de ordem dos cartões emitidos naquele centro); breve texto solicitando comparecimento a um serviço de saúde por motivo de interesse pessoal; recomendações para evitar disseminação da DST; lista dos centros disponíveis para atendimento no município; data do preenchimento e assinatura do profissional de saúde responsável pela convocação.
CONVOCAÇÃO POR BUSCA ATIVA
Na eventualidade do não comparecimento de parceiros convocados por aerograma em sete dias úteis, deve-se proceder à busca ativa realizada por profissionais treinados especialmente para esse fim. Esta modalidade só poderá ser executada quando forem esgotados todos os recursos disponíveis.
É importante que se estabeleça comunicação entre os centros de atendimento a pacientes com DST a cada semana, a fim de se detectar os casos que necessitam do envio do aerograma ou da busca ativa. A existência de um profissional responsável pelo sistema de convocação de parceiros em cada centro, tornará esta atividade possível.
A informatização do sistema de convocação, com integração entre os centros de uma área geográfica, permitirá rápida troca de informações e o controle das atividades prioritárias. Tal sistema deverá ter senha para acesso de conhecimento apenas do operador e seu chefe imediato, os quais assinarão termo de responsabilidade em relação ao não vazamento de informações.
É importante, mais uma vez, enfatizar que, em qualquer situação, pode-se utilizar a convocação por meio do paciente índice e que cada unidade poderá implementar as atividades do sistema progressivamente, de acordo com a disponibilidade de recursos humanos e materiais.